Por Vicente Serejo – Jornal
de Hoje (05.02.13)
Não posso negar Senhor
Redator: nunca acreditei nesse milagre das obras da mobilidade que viriam com a
varinha de condão da Copa do Mundo. Quem, por acaso, percorrer os pobres
arquivos desta coluna, vai perceber que desde o início não molho os bigodes
nesse caldo. Desde quando andei chamando de ‘Estádio Delirante’ a Arena das
Dunas, no Governo Wilma de Faria. Atravessei os nove meses de Iberê Ferreira e
nos dois anos do Governo Rosalba Ciarlini ainda continuo desconfiando.
Não se trata de ceticismo,
conceito tão caro à filosofia por não creditar ao homem o poder de atingir o
absoluto. É que, entre nós, o absoluto nada tem de sublime. Gastamos com a
compra do projeto, aceitamos muito satisfeitos a derrubada do Machadão e do
Machadinho nos quais os cofres municipais tinham acabado de investir R$ 17
milhões em reformas, pedimos um empréstimo de R$ 400 milhões e assinamos uma
dívida de R$ 1,2 bilhão a ser paga em vinte anos ou cinco governos.
Em troca? Obras, muitas
obras. Quase todas a fundo perdido ou financiadas com a bondade materna do
Palácio do Planalto e garantidoras daquilo que os nossos tecnocratas, sempre
criativos e céleres, chamaram de obras da mobilidade. Aqui, então, anunciou-se
o Nirvana. Era como se afinal o País de Saruê saísse do imaginário popular e se
materializasse com seus açudes de leite e barragens de carne de sol, numa
fartura de progresso a matar da mais cruel inveja a Dubai ou Abu Dhabi, sei lá.
É verdade, Senhor Redator, a
então prefeita Micarla de Sousa, ao longo desse sonho que não foi seu, mas a
ela conquistou a ponto de fazer surtá-la, anunciou mundos e fundos. Avenidas
bonitas que iam de um lado ao outro da cidade, viadutos, corredores para
ônibus, o prolongamento de ruas e avenidas. Os motoristas de táxis, para se ter
uma ideia do efeito da Copa, falariam inglês e espanhol, os garçons dariam
aulas sobre a história da cidade, com a riqueza borbulhando nas bocas de lobo.
Devo dizer que tudo isso
contribuiu para fazer nascer uma terrível desconfiança no milagre da Copa.
Primeiro pelo fastio que tenho do futebol, com as suas circunspectas e
cansativas nulidades. Depois, e perdoe o excesso grosseiro sem ser de baixo
calão, pelo arreganho desabrido com que se acredita em tudo. Até na riqueza que
gera, embora concentrada em alguns poucos dos nossos ídolos, protagonistas dos
precários episódios gerados por suas vidas que, de súbito, se tornam
milionárias.
Pode ser que tenhamos uma
cidade com obras bem concebidas ainda que não muitas. Tenho lá minhas dúvidas. Os quadros públicos
que no passado tiveram técnicos propulsores da modernidade urbana, hoje estão
empobrecidos, postos a serviço fácil de cada governo e suas mágicas. São
artífices do ontem, superados e vencidos pela incúria de um modo de governar
que deixou de buscar o bem estar individual e coletivo. Quem sabe teremos,
finalmente, e pelo menos, uma grande obra de ficção.
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